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Professor lança livro sobre variação linguística

A linguagem padrão é unificadora e serve de elo entre os falantes de diferentes variedades, unindo-os em uma comunidade linguística. É para orientar e regular o uso da língua nessas comunidades que existe a gramática normativa. Mas como são vistas as variantes ditas “não-padrão” de uma língua?

Para saber mais sobre isso, entrevistamos Roberto Gomes Camacho, professor de Sociolinguística da Unesp de Rio Preto, que lançou neste ano o livro Da linguística formal à linguística social (Parábola Editorial)e nos contou um pouco sobre como funciona a variação linguística no Brasil. Confira a entrevista:

Como a variação é vista no Brasil? E no mundo?

Embora a variação seja uma propriedade inerente das línguas, ela não é reconhecida como tal pelos usuários tanto do português quanto de outras línguas do mundo. Sempre que houver duas formas para representar o mesmo valor na comunicação, certamente uma é considerada a forma de prestígio e a outra a forma estigmatizada. No meu livro, debito essa dificuldade de aceitar a variação ao mito da Torre de Babel, que se traduz, no imaginário, como um castigo ancestral aplicado por Deus aos homens, que, com a construção da torre, tentavam atingir os céus. Talvez isso explique por que as instituições sociais procuram reduzir a diversidade (a atuação das chamadas forças centrífugas) em favor da norma-padrão (a atuação das chamadas forças centrípetas).

A norma-padrão faz parte da rotina dos falantes?

Como a variação, a norma-padrão faz parte da rotina dos falantes, uma vez que os processos linguísticos de padronização acabam por constituir um “mal” necessário para o funcionamento das instituições sociais. O grande problema é que, na sociedade brasileira, a norma-padrão é uma construção meio ideológica sem qualquer vínculo direto com o modo como falam de fato os falantes de nível superior de escolaridade, que constitui a variedade prestigiada.
Por que é necessário seguir um padrão?

Por causa da organização social, a norma-padrão assume certas funções que organizam os usuários da língua em torno de um bem comum e criam entre eles o sentimento de identidade e pertinência a uma nacionalidade. Uma dessas funções é a unificadora: a língua padrão serve de elo entre os falantes de diferentes variedades, contribuindo para uni-los em torno de uma mesma comunidade linguística. Se essa função opõe a variedade padrão às outras variedades, há uma função separatista, que opõe uma língua padrão a outras línguas, servindo, assim, de símbolo de identidade nacional. Outras funções relevantes são a do prestígio que a posse de uma língua padrão fornece aos usuários e a de servir de quadro de referência para o uso em geral a ponto de constituir uma medida de correção; mas serve também de quadro de referência para a manifestação da função estética da língua, relevante para a constituição de uma literatura nacional, que também identifica uma comunidade social.

Como ensinar a norma-padrão nas escolas levando em consideração a linguística social?

Uma boa receita é, em primeiro lugar, tolerar as variações, abstendo-se de corrigir o indivíduo na situação escolar quando usa uma forma desviante da padrão. Mostrar-lhe,depois, em outra situação, que a cada forma de sua variedade corresponde uma similar, mas diferente. É importante, no início do processo, tornar o aprendiz consciente das diferenças entre as variantes. Num terceiro estágio, seria necessário mostrar o valor social de que desfruta cada uma das formas para que o aluno seja capaz de escolher, sem imposição, que variante usar em cada situação discursiva, oral ou escrita, formal ou informal.

O seu livro Da linguística formal à linguística social, lançado neste ano, fala sobre sair de um ponto e ir a outro. Como se dá esse processo?

A noção de que os sistemas são fechados em si mesmos e autônomos, sem qualquer relação social com os usuários, não cabe numa visão sociolinguística, como a que defendo em meu livro. Não são os sistemas que variam e mudam por si sós, como defende uma visão formalista, mas é o trabalho dos usuários, atravessados pelas relações sócio-históricas, que conduz o sistema linguístico à variação e à mudança.

Há muito o que desbravar ainda na língua portuguesa?

Muito ainda. É necessário fazer, especialmente, uma revisão rigorosa das prescrições da norma padrão, que foram praticamente estabelecidas no Brasil entre os séculos XVIII e XIX a partir do português falado em Portugal. Estão aí as gramáticas de referência do português urbano falado por falantes de nível superior, que podem renovar o conceito prescritivo.

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