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‘Melhores professores de inglês não são britânicos nem americanos’, diz linguista

Ao contrário do senso comum, o melhor professor de idiomas não é o nativo, mas aquele que fala também a mesma língua do aluno. A vantagem desse profissional está na capacidade de interpretar significados no idioma do próprio estudante. Com a hegemonia ameaçada no caso do inglês, professores americanos e britânicos devem reavaliar a maneira como ensinam o idioma.

As conclusões fazem parte de duas pesquisas desenvolvidas pelo lingüista britânico David Graddol, 56 anos, a pedido do British Council, órgão do governo do Reino Unido voltado para questões educacionais.

No Brasil para participar de seminários sobre língua estrangeira, ele avalia que o ensino do inglês nas escolas brasileiras está muitas décadas atrasado em relação a outras nações e sugere que o país aproveite os Jogos Olímpicos e a Copa do Mundo para tentar correr atrás do prejuízo.

Durante 25 anos, Graddol foi professor da renomada UK Open University e atualmente é diretor da The English Company e editor da Equinox Publishing. Ele prepara um terceiro estudo, este focado mais na Índia, que será publicado até o final do ano. Leia abaixo os principais trechos da entrevista concedida ao G1.

G1 – Qual o perfil ideal de um professor de idiomas?
David Graddol – O melhor professor é aquele que fala a língua materna de quem está aprendendo o idioma. Também é preciso ser altamente capacitado e ter um ótimo domínio do idioma, claro.

G1 – O sr. considera então que os professores nativos estão perdendo terreno para outros que falam também a língua do aluno?
Graddol – Sim e não. O que acontece é que, usando uma metáfora, o bolo geral está crescendo, porque atualmente há cerca de 2 bilhões de pessoas aprendendo inglês ao redor do mundo. O fato de o Reino Unidos e os EUA estarem perdendo essa fatia de mercado é enganoso, porque a participação deles também está crescendo. No entanto, o bolo está crescendo mais e mais rápido. Em muitos países, há reminiscências românticas acerca do ensino de inglês. Muitas pessoas ainda pensam que os melhores professores são os nativos. Elas pagam inclusive a mais por isso. No entanto, minha opinião é que estão erradas. O que deve ser mudada é a maneira como o inglês é ensinado.

G1 – Como assim?
Graddol – O inglês passou a ser encarado como uma necessidade. Muitos países se relacionam e fazem negócios entre si por meio do inglês, sem que nenhum deles tenha o inglês como primeiro idioma. Em muitos lugares, o inglês deixou de ser ensinado como língua estrangeira, como na Cinha e Índia, onde o inglês passou a ser considerado uma habilidade básica. Nesses países, os estudantes começam a aprender o idioma já nos primeiros anos escolares. A ideia é que mais tarde, quando atingirem o ensino médio, passem a ter aulas de outras disciplinas por meio do inglês. Historicamente, falar uma língua estrangeira era sinal de status. Agora, o que acontece é que as pessoas estão genuinamente tentando universalizar o idioma.

G1 – O uso do inglês como “lingua franca” [quando um idioma é utilizado por pessoas que não tenham a mesma língua nativa] pode modificar o seu ensino?
Graddol – Há certas coisas que se tornaram comuns e que parecem uma nova variedade de inglês. E nós acabamos nos habituando a esse novo uso. São coisas simples, como a maneira em que as palavras são soletradas e todas as vogais, faladas. Muitas das vogais, nós, nativos da língua, substituiríamos por um único som. Essas peculiaridades, que não necessariamente devem ser consideradas erros, precisam ser levadas em conta no ensino desse inglês global.

G1- Como avalia o crescimento da demanda pelo ensino de inglês?
Graddol – O que está acontecendo é que, desde a década de 90, houve um aumento gradativo de pessoas aprendendo inglês e atualmente cerca de 2 bilhões de pessoas estudam o idioma. No entanto, nos próximos anos, a expectativa é que haja um declínio nessa demanda.

G1 – Como se explica essa previsão de declínio?
Graddol – As pessoas que hoje estão no ensino fundamental e aprendendo o idioma chegarão ao ensino médio ou superior já sabendo inglês. Em muitos países da Europa, quando chegam nesse ponto, esses alunos começam a ter aulas de diferentes disciplinas em inglês. Então, deixam de ser estudantes de inglês e passam a ser usuários da língua. Eles não têm mais um professor de inglês, mas um professor de geografia, por exemplo, que dá aulas em inglês. Esse declínio não significa que menos pessoas estejam usando inglês, mas que o inglês, ensinado no ensino fundamental, começa a fazer parte da alfabetização básica.

G1 – Que idiomas podem representar uma ameaça ao inglês? Mandarim é um deles?
Graddol – O mandarim não é uma ameaça. Certamente que tem crescido em popularidade, mas faz parte de um pensamento antigo, quando se achava que uma língua cresceria à custa de outra. No entanto, ambas podem crescer juntas, assim como outros idiomas.

G1 – Qual o impacto da internet no uso do idioma?
Graddel – A internet é outro bolo que tem crescido cada vez mais rápido. E nela são usadas mais línguas do que antes. É um lugar que acolhe línguas menores. Meu nome é galês e, se fizer uma pesquisa no Google sobre mim na internet, aparecerão diversas páginas escritas em galês. Isso é surpreendente porque, de repente, percebemos que há um universo paralelo na internet. E o mesmo acontece com o catalão. E muitas vezes não tomamos conhecimento disso porque uma página num idioma não tem link para páginas em outro idioma. A internet tem uma diversidade de línguas, mas o inglês acaba então sendo mais comum nos fóruns on-line de discussão e em relatórios técnicos.

G1 – O ensino do inglês é bastante rentável para os países onde a língua é falada.
Graddol – Os ganhos com o aprendizado do inglês não vêm só dos cursos de inglês mas também dos estudantes internacionais que vão para as universidades nesses países para terem aulas em inglês. Então, esse é outro tipo de exportação que pode ser creditada ao inglês.

G1 – A crise global afetou em algum aspecto o ensino do inglês?
Graddel – A crise global foi positiva para o setor porque provocou a desvalorização da libra esterlina e deixou o Reino Unido mais atrativo. O que aconteceu é que o Reino Unido deixou de disputar esses alunos com competidores tradicionais, como os EUA, a Austrália e, em certa medida, a Nova Zelândia. Agora, estamos perdendo para universidades na Europa, que têm cursos de diversas áreas que são dados em inglês. Um aluno coreano, por exemplo, pode estudar direito na Alemanha e ter aulas em inglês, além de estar bem no centro da União Europeia e quem sabe até aprender um pouco de alemão. Para ele, o ganho acaba sendo maior.

G1 – O ensino do inglês deve começar nos primeiros anos escolares? As crianças obtêm resultados mais consistentes?
Graddol – Diversos aspectos devem ser considerados. É possível começar a estudar inglês mais tarde. No entanto, se esse início for com 11 anos de idade, por exemplo, o número de horas dedicadas ao idioma precisa ser mais intenso, com, no mínimo, cinco ou seis horas. E esse ensino tem que ser bastante eficiente, que contemple o desenvolvimento de diversas habilidades da língua.

G1- Existe então uma idade ideal para começar a aprender inglês?
Graddol – Não. Na verdade, há vantagens e desvantagens em quase todas as idades. Conheço adultos que, com meia hora de estudo, têm rendimento maior do que uma criança justamente por causa da sua experiência adquirida ao estudar idiomas. Há vários outros aspectos a serem levados em conta. Um é que é muito mais fácil criar, numa sala de aula, um ambiente que motive as crianças a aprenderem. Elas aprendem quase sem perceber. No entanto, o principal argumento talvez seja que, como nem todas as escolas conseguiriam destinar um dia da semana de uma turma de alunos de 11 anos para ensinar inglês, o melhor é começar cedo. Assim, é possível obter um progresso gradativo, que permita ao estudante chegar no ensino médio falando inglês.

G1 – Como avalia a situação do Brasil em relação ao ensino e uso do inglês?
Graddol – No Brasil, o inglês é ainda visto como uma língua estrangeira. Em muitos outros países, as coisas avançaram muito rapidamente e não é mais visto como uma língua estrangeira. O Brasil parece estar muitas décadas atrás do resto do mundo em termos de inglês. O que está sendo feito aqui não é suficiente para produzir pessoas realmente fluentes em inglês. As escolas estão falhando ao ensinar inglês e isso é uma ótima noticia para o setor privado. As famílias que tiverem condição de bancar os estudos mandarão seus filhos para escolas de idiomas, o que gera a divisão social.

G1 – As Olimpíadas e a Copa do Mundo podem ser oportunidades para o Brasil correr atrás desse prejuízo?
Graddol – Certamente. Foi o que a China tentou fazer, usou as Olimpíadas como uma justificativa para implantar programas de melhoria de conhecimento de inglês para a população de Pequim. Foram estabelecidas metas. E é isso que o Brasil deveria fazer, porque, se não se estabelece metas, não se sabe onde quer chegar nem se você chegou lá.

G1 – E deu certo na China?
Graddol – Entre as metas estabelecidas na China, havia algumas em relação a policiais e taxistas, por exemplo. Mas devo dizer que não deram muito certo. Como alternativa, puseram uma maquininha dentro dos táxis que emitia a tarifa da corrida para facilitar a vida do turista. No caso do Brasil, o país deve ao menos tentar garantir que os funcionários de hotéis falem bem o inglês. E as metas precisam ser estabelecidas já, porque as mudanças levam tempo.

[FONTE: Portal G1]

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